quarta-feira, 17 de julho de 2019

O homem comum x A entrega ao Absurdo

O objetivo do ser humano é o saber, o entender.

Decifrar a si e o mundo.

Mas ignora o absurdo, que se desprende de razão, ao qual precisa encarar para finalmente saber.

E por medo ou autopreservação se esquiva do entender.

Leva em consideração apenas o seu horizonte linear que, em sua projeção, o leva a conhecer.

Enquanto o absurdo, independente de sua vontade, o espera às portas do fim.

Como o homem que confronta o guarda por querer entrar na única porta que lhe pertence.
E o guarda lhe pede paciência e alimenta sua esperança de pertencer.

Descobrindo, apenas no fim, que o seu ofício era insistir.
E o ofício do guarda era não permitir.

Conclui por fim, que o conhecimento não era linear: era circular.
E sempre foi assim.




quinta-feira, 11 de julho de 2019

De mim aos 28 para mim aos 18 anos

Tenho lembrado de você e pensado muito em nós. E, nos olhando hoje, vejo o quanto você era doce, boba e ingênua. Descobri que mesmo que não se perceba, a vida foi amargando a gente aos pouquinhos. Eu já não tenho mais aquele seu riso frouxo embora eu ainda sorria exageradamente.
Muita coisa mudou. E em meio a tantas andanças, gostaria de dizer tudo e tanto que nunca disse e você precisava ouvir.
Como esse relacionamento em que você está: é abusivo e no fundo você sabe. Você não sabe perder, mas precisa aprender. Mas não importa o que os seus amigos digam, ou seus pais ou o eu de agora, nada vai mudar sua visão. Você ainda é muito cabeça dura. Eu ainda sou. E se você não fosse tão cabeça dura, talvez eu não estivesse aqui, exatamente neste ponto de vista. Neste ponto da vida.
No entanto, não quero me apegar aos "e se's" que deixamos pra trás.
Me entristece perceber que você não se vê. Além de linda, é inteligente, esperta, pega as coisas no ar, embora solte-as com a mesma facilidade em que as pega. Você é forte, mas não sabe.
Sobre seus pais: eles também estão crescendo. E você faz parte do crescimento deles tal como eles fazem parte do seu.
Os próximos 10 anos trarão muitas surpresas, sabe? Algumas não tão boas, outras maravilhosas e outras facilmente esquecíveis. Você vai conhecer muita gente. Se afastará de alguns, reforçará laços com outros e vai amar e ser amada muitas e muitas vezes! Para essas dores que agora insistem em ficar, você terá as respostas que tanto busca no devido tempo. E eu te daria essas respostas se pudesse realmente te alcançar.
Alerto que você conhecerá muitos imbecis ainda. Mas quanto a eles, não se preocupe. Não vão demorar e só vão desperdiçar um pouquinho do seu tempo. Alguns deles tentarão entrar apenas no seu corpo, enquanto outros desejarão ir mais longe, tentando entender sua cabeça, seus desejos e principalmente sua liberdade.
Inclusive, pare de se culpar por ser assim, tão "pra frente". Faz parte da sua essência e nenhum discurso moralista vai mudar isso. Pare de se esconder de si mesma, de outras pessoas, do mundo. Seus aprendizados serão mais claros quando você decidir finalmente ser você.

  • Nota: esse texto começou assim, com conselhos que eu me daria se eu me pudesse encontrar há 10 anos. Eu poderia ter apagado ou ignorado essa linha de raciocínio, como se nada houvesse. Mas não faria sentido esconder o contraste que se apresentou pra mim enquanto eu escrevia. Enquanto eu narrava um possível diálogo entre meu eu aos 28 e o meu eu aos 18.


Depois de mostrar pra aquela menina o quanto amadurecemos, o quanto crescemos e, olhar pro passado como uma salvadora de mim mesma, muito madura e articulada, a menina do passado me disse sorrindo, com uma gentileza que é só dela: nós não precisamos ser salvas.
E me abraçou no reflexo de um espelho que há muito eu ignorava por medo ou preguiça de confrontar tudo o que, com calma e paciência, me pedia um pouco mais de atenção.
Fui eu, tão evoluída e madura, quem chorou no colo da minha menina do passado.
Aquela menina superou coisas que hoje me assombram. E ela nem tinha estrutura para tanto.
Visitei nossas memórias e os primeiros textos, alguns de quase 20 anos atrás, tão mais existencialistas que os de hoje. Ela era forte e sabia.
E foi ela que, mesmo sem tantas ferramentas, me fez permanecer forte. O tempo passa e a gente acredita que a crescente evolução do nosso eu é uma constante. Quando na verdade, evolução não é crescente. É circular. Evoluir é entender que a vida é ciclo. E essa é a única constante.
Ao se perder da gente, é preciso fazer o caminho de volta e buscar respostas com quem mais te conhece: você.
Porque tudo (ou quase tudo) que você está passando agora, provavelmente já passou, já foi resolvido em outro tempo, embora sejam dores pontuais que sempre voltam pra que a gente possa reaprender, relembrar. Ferir e cicatrizar.
Agradeça a sua menina de ontem por ter te transformado na mulher de hoje.
Você sempre aprenderá algo ao revisita-la.




segunda-feira, 8 de julho de 2019

Você fica tão sozinho as vezes que até faz sentido

Você fica tão sozinho as vezes que até faz sentido.
Esse é o título de um dos livros de poemas do Bukowski (inclusive, para os existencialistas de plantão, recomendo fortemente). Mas não é sobre o livro ou sobre Bukowski que vim falar. É sobre o hábito de ficar sozinho e se acostumar de tal maneira que, conviver com outra pessoa parece um tanto desconfortável.
Somos moldados por hábitos e rotinas. E quando sua rotina é quebrada por interferência externa, as reações são as mais diversas, de moderadas à extremas.
A solidão propõe autoanálises de dar nó e é natural que seja assim. Mas do nó se faz laço que gera autoconhecimento. Gradativo, vale ressaltar. Requer tempo e paciência. É metamorfose à longo prazo. E nesse processo, cuidemos dos nós. E de nós. Coisa que não é tão fácil quanto parece. Se perceber por si só já é bem difícil, as distrações são incontáveis. É preciso desacelerar.
Das reações diversas, sou intima de duas: a exagerada expectativa no outro, ou a rispidez quase que sem notar. A segunda, particularmente é o que me preocupa. Afinal, expectativa é excesso de amanhã. E ando cansada demais para acelerar até o futuro mais próximo. Além do mais, o amanhã não tem de doer. Ou pelo menos não deveria.
Já a rispidez involuntária, meio que sem querer, machuca quem não tem nada a ver com as suas conversões. A grande questão é se perceber o suficiente pra evitar farpas em você e nos outros.
Acontece que estar só é muito mais confortável (quando é rotina). E com tanta facilidade de comunicação (ou isolamento), as pessoas estão à um click de distância. Interagir pessoalmente já não é mais tão interessante. Já não visitamos uns aos outros, limitamo-nos a visitar feeds.
Acabamos valorizando mais os números de seguidores nas nossas redes e esses não questionam, nem pedem explicação. Mas você já se perguntou onde estarão seus seguidores quando você realmente precisar deles? Quando a demanda não for engajamento, mas amparo? Ou quando a solidão finalmente virar laço e, você precisar, desejar e até salivar com a possibilidade de uma interação mais palpável? 
 A sensação é de que desaprendemos a conviver. A solidão real e cotidiana torna-se hábito. E o silêncio se torna personagem. Eu esperava trazer respostas aqui. Mas saí com mais perguntas. No entanto, estimular o questionamento já é um grande passo.

Eu não sei em qual momento você está. Mas talvez, pode ter chegado a ocasião de ser um bom anfitrião da sua própria vida. Deixe vir e, se a estadia for breve, agradeça a visita.
E como lembrete final: “eu levei um longo tempo para encontrar a pessoa mais interessante com quem beber: eu mesmo.” (a última dose)
Bukowski sempre acerta.