Pra sermos aceitos a gente acaba optando por máscaras tão inúteis quanto guarda-chuvas de R$ 9,99. Mas assim como guarda-chuvas baratos atraem pelo preço, tais máscaras atraem pelo apreço. E se as máscaras nos caem tão bem, naturalmente atrairá outros tantos mascarados carentes de algum mínimo de afeto nessa sociedade onde o que impera é o desdém.
Quando a gente despe até a alma, só o que resta é o reflexo dos erros, das cicatrizes do tempo, dos passos tortos. Os ossos inflamados e a ausência de disposição pra seguir. E até nisso há beleza, porque é humano. As vezes dá vontade de se ajeitar num cantinho e lá ficar, só um pouquinho. Até acalmar a tempestade.
Eu não sei o que sinto. E se soubesse, provavelmente calaria ainda assim. O caminho que eu escolhi e que me escolheu também, me ensina muito, todos os dias. É preciso visitar os próprios abismos. Conhecer a própria escuridão e aprender com ela. Sentir o que vier e lidar com isso. No meu caso, é esvaziando e dando espaço ao novo. Esvaziando pra limpar a casa. Pra limpar a alma.
Foi então que decidi desapegar. De coisas, pessoas e de alguns sentimentos também. Tem gente que fica tão bonita na liberdade de andar só, que não cabe insistir na caminhada à dois. É melhor deixar partir. Assim como os meus livros já doados vão fazer sala em outra casa e prender a atenção de outros leitores, pessoas amadas por mim (muito bem amadas, inclusive), vão enfeitar outras vidas. É justo, afinal ser livre é a arte de não pertencer e não possuir também.
Para alguns, desapego parece altruísmo. Mas eu não vejo dessa forma. Desapego é sobrevivência. É como abandonar o barco antes que ele afunde. É auto defesa. É a reação prévia contra a dor. Embora a dor também precise ser sentida. Como tudo nessa vida.
A gente não escolhe por quem se encanta e muito menos quando isso acontece, ou nos damos conta de que aconteceu. É o maior clichê que eu conheço, mas é verdade. Só que quando a gente gosta mesmo de alguém, conseguimos entender o momento de partir. A vontade de morar no universo do outro não pode ser maior do que a vontade de permanecer no próprio universo. Tá aí a maior vantagem do desapego: abrir mão de tudo, exceto de si.
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